segunda-feira, 28 de julho de 2014

Ilze vive em Riga

Riga, Letónia

Como sempre, depois das aulas passou nas Rigas Galerija.
Gostava de passear por aqueles corredores. Experimentava vestidos. Cobiçava sapatos. Acrescentava malas à lista de desejos. Recolhia amostras de perfumes. E por duas vezes aventurou-se a levar dois cremes sem pagar.
Por vezes, ia com as amigas. Falavam dos rapazes. Sobretudo dos estrangeiros que chegavam à universidade. Eram bonitos, educados e tinham dinheiro.
Juntas, elas falavam dos amores, das casas nos novos países onde viveriam e das viagens que fariam com eles. Todas sonhavam com grandes casas, idas ao spa, férias em praias paradisíacas e filhos de nome Thomas ou Marie Claire.

Depois, Ilze passava no Rimi, onde fazia as suas compras. Naquele dia levou uma salada de maionese, um chocolate Laima e dois vernizes em promoção.

Ilze tem 22 anos e apesar de russa no passaporte, ela nasceu em Riga, na Letónia.
Quando o país conquistou a independência em 1991, ela tinha 5 anos e lembra-se que os desenhos animados deixaram de ser em russo e de deixar a casa com jardim, para viver numa casa a cheirar a mofo, junto ao mercado das pulgas. Passou a dividir a cama com a avó, que morreu dois anos depois. A avó de Ilze chorou todas as noites até à noite da sua morte. Todas.

Em sua casa em família eram como estranhos. Habituados aos silêncios, os olhos já não se cruzavam. A mãe outrora de pele branca e mãos suaves de pianista, engordara e vendia roupa em segunda-mão para as matronas letãs e russas. O pai bebia até se esquecer do presente, vivendo num passado que Ilze nunca conheceu.

Todas as noites, Ilze saía. Bem maquilhada - mito bem maquilhada. E de saltos altos. Mesmo no Inverno, nunca saía sem os saltos altos. Os que levava hoje já estavam um pouco gastos, mas nada que um marcador negro não resolvesse.

Assim que chegada ao bar, sentava-se e pedia um Martini Branco. Minutos depois e alguns olhares trocados e ela já estava acompanhada.
- Hi! Do you speak english? - perguntou-lhe o rapaz de sardas.
Não era bonito, Ilze sabia-o, mas bastou uma mirada rápida para os sapatos do home e Ilze soube logo que ele tinha potencial.
- Yes, I do - respondeu, enquanto sorria, um sorriso que nunca partilhava com ninguém mais, enquanto que com a mão colocava o cabelo para trás do ombro.
- My name is Tony. And you? - perguntou o jovem, chegando-se mais perto de Ilze.
- "Tony" - disse ela. E Ilze pensou também no Anthony em Abril e no Pierre em Dezembro passado, mas desta vez ia ser diferente.
Ela sabia que ia. Tinha que ser.