segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Ela levava porrada do homem

Primeiro, os gritos. Os insultos. As ameaças.
Depois, as patadas, os socos, os tabefes.

Quando quis ir embora, as desculpas e as juras do amor eterno. Tudo ia ser diferente e ela ficou.
Pouco tempo depois e durante algum tempo, ela acreditou nele e que "não valia nada!", que estava "tramada" e que era "uma puta do pior".
E sempre mais pontapés, murros e gritos.

Os amigos diziam que estava abatida. Falava menos, não sorria, assustava-se facilmente.
Depois, deixaram-se de queixar, porque ela deixou de aparecer.

Mais bofetadas, a faca junto ao corpo, os filhos a chorarem.

Até que um dia ela fez queixa.
Não se foi embora, porque não tinha para onde ir.

Na polícia anotaram a queixa e mandaram-na para casa.

Os outros arregalaram os olhos. Surpreendidos diziam que "ele não seria capaz de uma coisa assim" e quando ela não estavam diziam "que só quem está dentro do convento é que sabe o que vai dentro". No trabalho ninguém nunca lhe viu uma negra e "olhe que na festa da empresa, ela ia com um vestido bem curto!"
Na família, houve até quem lhe perguntasse "Mas o que é que tu lhe fizeste, rapariga? Alguma fizeste!".

No tribunal, ele voltou a chorar, até pôs a mão no peito, jurando pelos filhinhos.
Hoje ela morreu. Ele matou-a.