quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

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Na segunda-feira foi ao médico que as dores já eram muitas. Mesmo assim foi obrigado. Na segunda-feira diagnosticaram-lhe um tumor.
No dia seguinte falou-se em quimioterapia ou em morrer em casa.
Passou um dia e já nem havia opção. "Seria uma questão de dias!" e da clínica não podia sair.
No dia depois deste, contaram-me por fim o que se passava.
Em menos de um dia, eu já estava ao lado dele. Choramos, falamos e ele esforçava-se para me fazer perguntas. Para manter a conversa. Disse que "gosto muito de do coração". No fim do dia, devido ao aumento da medicação, já se confundia. Quando o fazia rir, pedia para parar, porque as dores eram muitos.
Mais um dia e ele mais fraco. Já com auxílio para respirar. Pouco falou. Não conseguia estar sentando, porque doía muito. Ele magrinho, magrinho e a barriga grande e dura. As dores. Os gemidos. Cuspiu sangue. Naquela noite quando me despedi, disse-lhe que gostava muito dele e que se quisesse, podia ficar por ali, que uma vez na vida, podia desistir.
Novo dia e ele lá. Mais fios. Mais drogas. E uma máscara que teimava em tirar. Quando eu pensava que ele não podia piorar, ele piorou. Perdeu a cor e a expressão. Não sorria. E transpirava muito, muito e por isso, estava sempre muito frio. Por que é que ninguém parava aquilo? Formulei pedidos na minha cabeça, mas nunca tive coragem. A enfermeira disse que pela experiência dela, ainda faltava. Disse também que normalmente morriam de madrugada. Desejei com muita força que assim fosse.
Mas não, novo dia e ele lá. Bem, ele não, porque aquele já não era ele, O médico disse que podia levar dias e foi aí que eu pensei "E se eu...". Também não tive coragem para isso. Mas como era possível levar dias? Ele não respirava, ele agoniava, o olhor não tinha brilho, nem empatia,.. como assim DIAS? Por fim, acabou! Nos dias seguintes só consegui sentir um enorme alívio por aquilo ter acabado para ele. Aquela agonia, aquela não-existência, aquela forma de nada-ser.

Ele que tinha tanta vida e alegria. Que cantava "olai-lari-lo-lela" e mesmo aos 78 anos me pegava ao colo. Ao telefone mandava-me sempre "beijinhos do coração". Ele que punha açúcar no pão e almoçava arroz doce. Subia telhados, fez casas e arranjava tudo e a toda a gente.

Só há cerca de duas semanas passou o alívio e só há cerca de duas semanas chorei como não sabia ser possível alguém chorar. Agora sinto muitas saudades e não sei lá muito bem como viver assim.

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